quarta-feira, fevereiro 23, 2005

O Pai Esquece

Father Forgets
Ouve, meu filho:
Falo-te enquanto dormes, a mãozinha debaixo do rosto e uma madeixa loira, húmida, caindo sobre a testa. Entrei no teu quarto, só e às escondidas. Há poucos minutos, quando lia o jornal no meu gabinete, apossou-se de mim o remorso. Reconhecendo-me culpado, vim para junto de ti.
Vou dizer-te, filho querido, o que estive a pensar: tenho sido exigente demais contigo. Repreendo-te quando te estás a vestir para ir para a escola; porque lavas o teu rostozinho passando-lhe apenas uma toalha húmida. Censuro-te porque os teus sapatinhos não estão limpos. Chamo a tua atenção com aspereza, quando atiras ao chão alguma coisa que te pertence.
Ao café, encontro mais faltas. Ralho porque desperdiças as coisas, comes apressadamente, pões os cotovelos na mesa e manteiga demais no pão. Passo o tempo a ralhar contigo, meu filho. E, quando sais para brincar e eu vou tomar o comboio, levantas as mãozinhas com um aceno de amizade, e dizes: «Até logo, papá!», e eu, na ânsia de te repreender, franzo a testa e respondo: «Endireita os ombros!».
Quando regresso, à tarde, recomeço as minhas exigências. Enquanto venho pela estrada, procuro-te; vejo-te de joelhos, a brincar com os teus amiguinhos. Descubro buracos nas tuas meias; humilho-te perante os teus companheiros, mando-te seguir para casa à minha frente. «As meias são caras; se tivesses de as pagar, serias mais cuidadoso!». Imagina, filho adorado, tudo isto dito de pai para filho!
Lembras-te de que mais tarde, quando eu lia no meu gabinete, vieste timidamente, com uma espécie de mágoa a brilhar nos teus olhinhos? Quando, aborrecido com a interrupção, olhei para o jornal, hesitaste em entrar. «Que queres?», disse eu, intempestivamente.
Não disseste uma só palavra, mas correste para mim, deitaste os braços ao meu pescoço, beijaste-me e os teus bracinhos apertaram-me com o afecto que Deus colocou floresente no teu coraçãozinho e que mesmo toda a negligência não pode destruir.
E, então foste aos pulos pela escada acima.
Pouco depois, meu filho, o jornal caiu-me das mãos e invadiu-me um receio doentio. Que vantagens me poderia trazer a maneira como te tratava? Descobrir as tuas faltas, repreender-te por coisas sem importância, era a recompensa que te dava, por seres uma criança. Não porque não te amasse; mas porque queria exigir demasiado da tua infância. Tratava-te como se tivesses a minha idade.
E no teu carácter há tanto de bom, de fino, de verdadeiro! O teu coraçãozinho é tão grande como a própria aurora, quando desponta sobre as grandes montanhas. Não podias dar-me melhor demonstração de tudo isto, do que, depois de tudo e apesar de tudo, correres para mim a beijar-me, carinhosamente, dando-me as boas noites. Meu filho, hoje nada mais importa! Vim para junto de ti, e, na escuridão ajoelhei-me envergonhado!
É uma fraca reparação, mas sei que não entenderias estas coisas, se eu as dissesse quando estás acordado. Mas, filho adorado, vou ser um verdadeiro pai. Serei um companheiro teu, sofrerei quando sofreres, rirei quando rires, não direi mais palavras de impaciência. Repetirei a mim próprio, como se fosse um ritual: «O meu filhinho nada mais é do que uma criança pequena!»
Receio ter te encarado como se fosses um homem. E, contudo, quando te vejo agora, filho querido, deitado e despreocupado na tua cama, vejo que ainda és uma criança. Ontem, ainda estavas nos braços da tua mãe, a cabecinha recostada no seu ombro...
Eu estava a exigir demasiado de ti. Demasiado...
W. Livingston Larned

2 Comments:

Blogger Unknown said...

Belo texto. Aqui está um caso de uma pessoa que não sabe exprimir da melhor forma os seus sentimentos.

3:02 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Аw, this was a reаlly nісe рοst.

Fіnԁing the tіme anԁ аctual
effort to make a tοp notсh artіcle… but whаt can I say… I hеsitate a lot and don't seem to get nearly anything done.

Review my web site: gardening

4:14 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home